Construir uma Casa da Árvore na varanda me transformou em um profissional melhor

O quanto você desperdiça seus talentos usando-os apenas no seu trabalho? Como empreendedor eu passei anos focando todo meu talento e energia apenas na empresa. E não foi o melhor para eles, nem para a empresa. Também foi péssimo para mim, para minha família e meu convívio com amigos. Perceber isso não foi óbvio. Foi um processo que começou quando todas estas esferas estavam bem prejudicadas. Com tanto foco, uma fase ruim da empresa deixou minha auto confiança no chão.

Foi quando o Livro “Descubra Seus Pontos Fortes” me foi recomendado e caiu como uma luva para o momento. O livro é resultado de uma pesquisa de longo prazo com milhões de pessoas e compila em um teste uma metodologia que ajuda a identificar seus talentos dentre uma lista de 34 possíveis. Naquele momento, foi uma importante ferramenta que me ajudou a (re)descobrir fontes de força. Seus pontos fortes não são de uso exclusivamente profissional e a consciência deles me ajudou a usá-los em diversos contextos, até mesmo no convívio com amigos. 

Um reencontro em especial abriu a minha cabeça: com meu potencial criativo. Desde criança eu uso esse potencial em diversas esferas. Programei jogos de computadores para eu mesmo jogar, produzi diversos produtos (de adesivos a camisetas, passando por jornais) que vendi na escola, para meus parentes e mais tarde na universidade. Até na hora de comprar um carro, limitado pela meu orçamento que não me permitiria ter um normal, criei meu próprio carro. Comprei e reformei um Jeep Willy’s ano 1958 que me serviu como meio de locomoção, mas que representou muito mais que um carro, sendo minha criação ambulante por anos. 

Quando resolvi empreender pela primeira vez, a empresa acabou levando o nome  que eu sugeri: Creare. E da última vez, na Onyo, o mesmo aconteceu. Mas lá essa energia criativa foi muito direcionada também para o produto. Isso pode ter sido bom. Mas ela não foi somente direcionada. Toda ela foi canalizada para a empresa, não sobrou nada para as outras esferas. E ter a empresa como o único foco de realização deste potencial era frustrante, para mim e para as outras pessoas na empresa. Não dá para reinventar uma empresa toda semana, nem mesmo o produto. 

Nesse período, meu Jeep estava parado na garagem. Já não o usava mais, nem conseguia tirar da gaveta os projetos que tinha para ele. Nem mesmo com meus filhos esse potencial era muito usado. Então, sem muita certeza do que estava fazendo, resolvi vender o Jeep. E vendi. Agora ele deixara um simbólico espaço vazio na garagem que me lembrava diariamente que esta energia criativa podia ser usada além das fronteiras da empresa. 

Então surgiu um novo projeto. Da vontade de usar mais a varanda de nosso apartamento e para isso deixá-la mais agradável, pensei em transformar a idéia de uma caixa de madeira para cobrir o ar condicionado em algo com uma utilidade a mais. Construiríamos a caixa, mas em cima dela faríamos uma Casa da Árvore. Meus filhos, é claro, adoraram a idéia. Não importava que ela não seria em cima de uma árvore. Quantas crianças tem a sua própria Casa da Árvore? Ainda mais morando em um apartamento? Era um presente diferente, um projeto de família, algo especial. 

Projeto 3D da Casa da Árvore

Desenhei com as crianças as primeiras idéias, depois sentamos no computador e o projeto virou um modelo 3D. Com o modelo pronto, preparamos uma apresentação em Power Point. Eles gravaram em vídeo a apresentação para a aprovação da mãe. É claro que a primeira reação foi de insegurança. A contribuição materna acabou sendo muito positiva. Com essa reação eu mesmo pensei nos pontos que estavam me deixando inseguro sobre o projeto.

Maquete de palitos de sorvete

Resolvemos reforçar estes pontos e fazer uma maquete para ganhar mais segurança. Foi ótimo, pois encontramos outros pontos do projeto que poderiam melhorar, foi mais uma fase criativa e construtiva, com muita contribuição das crianças para montar a maquete. A contribuição de todos foi importante, não só porque ela tornou o projeto nosso, mas porque sem ela, o mesmo realmente poderia ter falhado. Uma grande lição de trabalho em equipe. Sem clichês, uma das coisas mais importantes ao reconhecer seus pontos fortes e o potencial de se focar neles, é reconhecer também a importância de se associar a quem os complementa. Neste caso a complementariedade do casal, em especial, foi importantíssima.

Encomendei todas as madeiras nas medidas certas para não ter que serrar quase nada. Só pregar e aparafusar. Teoricamente chegou o Kit pronto para montar. Mãos à obra. É claro que não foi assim. Tive que ir três vezes à madeireira, por erros meus no projeto e adaptações que tive que ir fazendo conforme ele foi avançando. Especifiquei material a menos, tive que mexer na altura entre outros ajustes. Mas tudo bem. Quem já viu um projeto que não tem um monte de Change Request no caminho?

A Casa da Árvore pronta e em uso

Na montagem também busquei envolver toda a família. Todos ajudaram a aparafusar, lixar e envernizar. Nem sempre dava, o que gerou alguma frustração. Mas com a contribuição em compreensão de todos, o projeto ficou pronto. Fez sucesso com a criançada. Os amiguinhos ficaram doidos para conhecer e subir na Casa da Árvore. Minha energia criativa foi transformada em realização fora de um contexto profissional. 

Será?

Todo esse projeto vinha sendo processado na minha cabeça como algo além de um projeto pessoal. Não era um movimento profissional, mas era. A inspiração era do livro Anticarreira (de Joseph Tepperman), onde ele quebra o conceito de carreira como algo estreito e restrito. A carreira pode ser composta de várias esferas e iniciativas que se misturam, se complementam e se ajudam. Um executivo pode dar aulas, ou investir em startups e assim aprender coisas que o ajudem nas suas atribuições como executivo. Mesmo atividades aparentemente pessoais podem contribuir para a construção de um profissional. Expandir o uso de mina energia criativa para além da empresa me ajudava a “afiar o machado”, a não reinventar nada na empresa desnecessariamente. E não era um gasto dessa energia, mas sua potencialização. 

Por isso, preparando minha última palestra, resolvi incluir a história da Casa da Árvore para passar essa mensagem. Assim, esse projeto pessoal foi colocado em um contexto profissional definitivamente, fechando um ciclo que começou neste contexto. E esse fechamento foi muito bem sucedido. A palestra ganhou uma capacidade de conversar com a história pessoal de cada um muito maior e a mensagem foi absorvida com mais impacto. Os feedbacks foram muito positivos.

Quantas vezes nos esforçamos muito para separar a esfera profissional da pessoal? Quanto estamos deixando de aprimorar nossos talentos concentrando-os em apenas uma destas esferas. No momento atual, muitos estão sentindo mais dificuldade de separar estas esferas. Esse pode ser um sofrimento, um grande desafio, mas também um importante convite. Todos estão mais tolerantes a entender que o outro tem uma vida pessoal, tem filhos, família e precisam dar conta de todas estas esferas. Permitir que elas se somem, que seus talentos possam ser praticados em mais de uma esfera pode ser muito poderoso. Considere esta história um convite. 

Publicado por Fernando Taliberti

Sou um empreendedor, entusiasta de inovação e tecnologia, maníaco por livros de negócios. Adoro absorver conhecimento e usar ele para construir o novo, mas também para compartilhar escrevendo e palestrando.

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